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A judicialização da venda de sacolas plásticas: pontos de atenção para evitar contingência jurídica

Um assunto que vem ganhando relevância nas rodas de conversas sobre o varejo é a judicialização da venda de sacolas plásticas em supermercados. Apesar de haver legislação disciplinando o tema em algumas cidades, e uma série de decisões judiciais de relevância que já estabilizam a sua possibilidade, alguns consumidores têm ido ao judiciário buscar reparações (morais e materiais) sob a perspectiva – equivocada – de que essa venda seria conduta abusiva e lesiva.

A cobrança de sacolas práticas é realizada em estabelecimentos da capital baiana já há alguns anos. Tal iniciativa se justifica pelo intuito de zelar por um consumo mais consciente de plástico, evitando assim a utilização desenfreada de sacolas que acarretam danos sérios ao meio ambiente.

Embalagens, principalmente as de plástico, são um problema sério para o meio ambiente. Além do fator inerente ao seu descarte, ao acúmulo em lixões e até mesmo ao comprometimento da vida marinha, o seu processo industrial também exige a utilização de matérias-primas nem sempre renováveis, com grande potencial de poluição em cadeia.

A discussão acerca desse assunto já foi apresentada algumas vezes no âmbito do judiciário; tendo, em diversas oportunidades, a comercialização sido vista como prática lícita, não implicando em ofensa à relação de consumo ou a qualquer direito do consumidor. Nesse sentido podemos citar diversos exemplos, como o parecer do Ministério Público de Minas Gerais por demanda do Procon. Veja-se trecho destacado abaixo:

“Nenhum consumidor fica obrigado à sua aquisição. Trata-se de uma faculdade. Isto é, não há impedimento ao consumidor se este quiser levar suas próprias sacolas, ou ainda, utilizar outros meios para o transporte da compra. A comercialização de sacos plásticos não é feita coercitivamente, ou de forma imposta pelo estabelecimento, sendo assim, não há de se falar em abuso de direito. (Parecer nº 13/2022 – PGJMG/Procon-MG/ASJUP).”

Em Salvador, a Lei municipal n. 9.699/2023 vedou a disponibilização gratuita das sacolas plásticas. A medida funciona como forma de desincentivar o uso excessivo de materiais plásticos e, em consequência, reduzir os impactos negativos ao meio ambiente da atividade de consumo. Logo, é evidente que a comercialização de sacolas é lícita, não havendo que se falar em qualquer violação de direitos. Na capital baiana a retórica é ainda mais forte: vender sacolas plásticas não é só uma possibilidade; é, na verdade, uma obrigação.

Importante também ressaltar que a legislação de Salvador não inovou em absolutamente nada. A edição de normas similares é uma tendência global, já contando no Brasil com diversas cidades adeptas. A lei, em cidades que adotaram esta prática há mais tempo, chegou a ser questionada judicialmente em sentido mais amplo, mas em todos os casos se reafirmou a sua legalidade e eficiência. A exemplo disso, veja-se trecho do julgamento da Ação Civil Pública manejada em São Paulo:

 “Ação civil pública. Capital. Proibição de distribuição gratuita ou venda de sacolas plásticas. Estímulo do uso de sacolas reutilizáveis. (…) A proibição de fornecimento de sacolas plásticas, dirigida aos estabelecimentos comerciais, não implica em ofensa à relação de consumo ou a qualquer direito do consumidor e não há norma que respalde o ‘dever’ do estabelecimento comercial de fornecer gratuitamente meios para o acondicionamento de produtos pelo consumidor. A lei incentiva o uso de embalagens reutilizáveis e para tanto o consumidor pode optar por diversas alternativas à sacola plástica. A compra do produto não implica em direito do consumidor ao recebimento de ‘sacola plástica’, ou qualquer outro meio, para o seu transporte. (…). O tempo indica que medidas estão sendo implantadas para que seja efetivada a correta gestão de resíduos sólidos na cidade, que não depende apenas da atuação do Poder Público, mas do esforço de toda a coletividade. – Improcedência. Recurso da autora desprovido. (TJ-SP – AC: 10026181420158260053 SP 1002618-14.2015.8.26.0053, Relator: Torres de Carvalho, Data de Julgamento: 21/11/2019, 1ª Câmara Reservada ao Meio Ambiente, Data de Publicação: 21/11/2019).”

Nesse sentido, a decisão sobre a comercialização de sacolas está dentro do campo de livre iniciativa do estabelecimento que fornece o produto, assim como a aquisição está a critério do consumidor.

Por fim, ressalta-se ainda que a venda, embora permitida – e em alguns casos até obrigatória – não está isenta do cumprimento do contexto de leis do âmbito consumerista. Assim, para que a conduta, na prática, não incida em nenhuma violação a direitos, deve-se manter especial atenção ao dever de informação clara e ostensiva, além de dinâmica que não seja vista como “venda casada”.

* RODRIGO LIMA: Líder do núcleo Contencioso-Cível do Fiedra Britto & Ferreira Neto – Advocacia Empresarial